quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Inter-representação!

Várias intepretações de um mesmo conceito!

Rolou no fórum Spell uma conversa sobre que usar gírias durante a interpretação do personagem atrapalha a mesa... Só que aí temos dois conceitos distintos.

Perceba a diferença entre interpretar e representar. Se como jogador interpeto meu personagem e digo "Aí eu chego no cara e tipo, tento convencer ele com papo mole, suborno e tal." é uma ação completamente válida, compatível e passível da mesma aceitação que um "Ó nobre mercador, tu sabes que tuas mercadorias são as melhores devido a teu tino pelos negócios e teu bom gosto, então faço um apelo a ti com um agrado.".

A diferença principal? A teatralidade da segunda frase, porque a mensagem ainda é a mesma.

Se estivesse representando, a primeira seria completamente inválida, enquanto que a segunda seria UMA possível / provável alternativa, a mesma que "Então, meu senhor, como você é um homem de bom gosto, tenho com algo aqui para oferecer que poderá prender sua atenção".

Se o jogo oferece mecânicas para disputas sociais (e grande maioria oferece), o sucesso delas não deveria depender da sua representação se o jogo tiver uma mecânica social, e sim do argumento proposto via interpretação e da capacidade do PERSONAGEM em convencer, não do jogador.

Essa distinção é importante, porque se como mestre você recompensa o rebuscamento das palavras e ignora rolagens faz com que duas coisas muito importantes aconteçam: jogadores introvertidos fiquem completamente proibidos de jogarem com personagens com habilidades sociais (jogadores muito tímidos, especialmente iniciantes vão sofrer nesse passo) e que perícias sociais são inúteis mecanicamente, já que um jogador com lábia afiada não precisará testar e vai sempre passar com sua capacidade de “caô" acima da média.

No caso dessa opção, que mesmo não sendo recomendada pela maioria dos livros e tal, vale que o mestre seja honesto e avise e impeça o jogador de gastar pontos em perícias e habilidades que serão inúteis. Diálogo é sempre a melhor ferramenta de comunicação entre jogadores e mestres.

Se o jogador estiver executando esse requinte com seu Orc de inteligência baixa e com isso pulando sobre as barreiras que a construção de personagem impôs pode facilmente a se tornar uma corrida armamentista de personagens, já que você não precisa se focar em recursos “sociais” que deveriam ser parte das limitações de seu personagem. E é um pulo que os jogadores percebam que somente naqueles que realmente fazem diferença em jogo, como poder de combate, influência e poderes sobrenaturais, tem chance.

E esse rebuscamento, mesmo no caso da representação e teatralidade é necessário?

Depende é claro das preferências pessoais de cada grupo, mas pessoalmente acho isso bobo e desnecessário. Gírias são recursos próprios a nossa comunicação e capazes de transmitir idéias rapidamente ou de forma acessível. Ao invés de explicar que o inimigo é um “infame, biltre, um sacripanta“, é muito mais fácil pra outro jogador (especialmente um iniciante) falar que o inimigo é um “sacana de duas caras” do que entrar num jogo de palavras. O sentido é o mesmo, apesar da sofisticação aparente dos primeiros termos.

A menos que as cenas sejam em proporção de diálogo 1 por 1 onde cada palavra da boca do jogador é proferida pelo personagem (o que, na maioria das vezes nem sempre é necessário), adoto a postura de que o personagem use uma expressão similar no contexto da cena em questão. Isso sempre poupou muitos problemas em mesa.

Vale também um problema em comum com esse eixo de interpretação e representação é a chamada “interpretação forçada”: ela consiste reclamar da forma que o jogador está “interpretando seu personagem errado”, contra as limitações e guias que o mestre impõe, como ir contra um estereotipo. Cito o velho caso dos clãs de Vampiro, onde em algumas mesas você jogar com algum personagem não-estereotipo era visto como uma afronta.

Convenhamos, limitações a parte do controle mestre, o personagem é domínio do jogador e ele deveria ser o responsável pelos seus atos no contexto.

Mestre, ao invés de reclamar e deduzir pontos de experiência ou seja lá qual for a solução metagamer que o sistema oferece, ofereço a seguinte aproximação: Cada jogador sofre as conseqüências dos seus próprio atos.

Ao invés de forçar o jogador a agir de determinada forma, cabe ao mestre analisar o caso e simplesmente perceber como aquilo funciona no contexto do jogo. Se na ficha está um comportamento padrão de "agir como cara legal", mas na prática faz ações que condizem com alguém que tem a denominação de "agir como um babaca", feitas de forma constante e deliberada, recomendo tratá-lo para propósitos de jogo e mecânicos (e tudo mais que isso acarreta) da mesma forma um personagem que se enquadra do comportamento "agir como um babaca", seja isso mudança de tendência, comportamento, natureza ou outras mudanças na ficha e todas ramificações de sistema que isso acarrete. Nunca declarei em voz alta "você está prestes a perder sua tendência / trilha / humanidade / requeijão" a um jogador, e pelo menos comigo, sempre funcionou.

Se o jogador teve um motivo ou razão para “agir como um babaca” (como por exemplo, um trauma com uma espécie de casta ou raça explicados no background do personagem) e reservar seus momentos menos heróicos contra aqueles dessa ideologia, sequer marcaria qualquer diferença na ficha; ser bondoso não é sinal de ser legal com todos, coisa que mestres esquecem. Senão, sem justificativa ele deveria sofrer das mesmas conseqüências que o jogador com ações aleatórias.

Por exemplo, um jogador que interprete um “paladino” (nos casos que isso representa um código de honra cavalheiresco, é claro) usando método de interrogatório ‘Jack Bauer’ e combatendo sem respeitar os inocentes atropelando-os com sua montaria sagrada porque "estavam na frente" e em seguida não entender porque ele perde seu status é simplesmente sem noção.

Porém, um jogador que interprete um “paladino” que faz o mesmo com os inimigos de sua divindade dificilmente perderá seu status como guerreiro sagrado a serviço da fé. Será louvado como heroí em seu meio.

Com isso tudo dito, cabe a você, leitor, descobrir na sua mesa suas próprias concepções. Porém, se a discussão parecer interessante, você sempre pode entrar e participar no nosso fórum, é claro!