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sábado, 6 de fevereiro de 2016

Interpretação e Otimização: Existe correlação?

RPG é um jogo de interpretação de papéis. Isso, todo mundo sabe – ou senão sabe, bem-vindo ao RPG, e esse artigo não é o melhor lugar pra você começar!

Vamos fazer uma pergunta importante aqui: “Você sabe a diferença entre interpretar e representar? Qual a correlação da otimização e interpretação? “

Segundo meu dicionário, interpretar é "Representar um papel, Reproduzir ou exprimir a intenção ou o pensamento de". Isso significa que você, ao assumir o papel de um personagem fictício num mundo igualmente fictício já estará interpretando em qualquer ação que desempenhe.

Ao dizer quais serão as ações do seu avatar fictício, você já está ~interpretando~ o comportamento, reações e atitudes desde personagem dentro dessa narrativa compartilhada. Cada jogador controla seu personagem desta forma, complementados pelos personagens não—jogadores (NPCs), interpretados pelo narrador / mestre. Existem jogos que propõem uma experiência diferente, como por exemplo, a ausência de um narrador / mestre para uma experiência de história verdadeiramente compartilhada entre todos jogadores.

Perceba que “interpretar” quer dizer apenas estar presente no jogo. Mas e a representação, Phil? Onde ela nisso tudo?

A resposta é simples: Ela não entra.

Representar, ou (segundo meu Michaelis) “Apresentar-se no palco ou em qualquer espetáculo público; desempenhar funções de ato” é uma teatralidade opcional, ás vezes agregada a interpretação (isso é, seu papel fictício).

Pera, como assim teatralidade é OPCIONAL!?
Dentro de um ambiente fictício da narrativa compartilhada, falar “Vou tentar subornar o guarda para que passemos pelo portão” deveria ter o mesmo peso que o jogador declamar “Ó protetor dos portais, sabes que faço um apelo a ti com um agrado para que possais olhar para o outro lado.”.  Nesta narrativa não existe distinção: a mensagem e ações passadas são as mesmas: “guarda, toma dinheiro”.

Por que então temos tanta reclamação quanto ao primeiro e tantos elogios em relação ao segundo?

Estamos acostumados a achar que mais rebuscado / elaborado é melhor; ao invés de acharmos um meio-termo agradável entre interpretação e representação, acabamos ignorando a primeira em defesa da segunda. Entretanto, naquele outro artigo, elaboro mais e falo sobre isso – se oassunto te interessou, sempre vale a pena ler!

Temos uma ideia de um eixo / parâmetro / régua que começa no modo automático (personagem meramente reativo), e termina na teatralidade excessiva (onde toda fala de personagem é feita pelo jogador como discursos 1:1), onde o primeiro é algo ruim e o segundo bom. O importante é perceber que em excesso, ambos são nocivos ao jogo como narrativa compartilhada.

Como assim "Interpretar Representar demais é ruim!?""
Agora que a diferença entre representar e interpretar estão bem definidas e fora do caminho, vamos falar sobre otimização de personagens.

Parafraseando uma frase que é papagaiada por tempos imemoriais, desde que a internet é a internet: “Um jogador apenas interessado em combos não quer saber de interpretar seu personagem!”

A atitude de otimizar uma ficha de personagem consiste em minimizar os pontos fracos e fortalecer os já fortes do personagem em questão. Logo, isso quer dizer que ele ficará melhor no que faz – e se o que o personagem interage dessa forma com o mundo fictício, um personagem otimizado fará essa interação com o mundo fictício de forma mais eficaz.

Um personagem otimizado por interesse em seu papel fictício, em relação a sua capacidade de sobrevivência desempenha melhor suas funções: 
 ● Um guerreiro que atinja melhor os oponentes e sobreviva melhor os perigos é um guerreiro bem-sucedido e consequentemente, tem maior chance de ser um personagem que permanece mais tempo em mesa.
 ● Um ladino que consegue causar o máximo de sucesso possível em suas jogadas de perícias tem a capacidade de evitar perigos de forma mais eficaz e com isso trazer maior sucesso para o grupo como um todo.

Veja que combos do nível “posso fazer tudo melhor que todos da mesa” não são otimização. Estes são combos que ultrapassam o nível de aceitação e torna-se algo nocivo. Mas a otimização per se, isto é, a capacidade de fazer bem aquilo que se propõe a fazer não é algo inerentemente ruim – e pelo contrário, é algo até exigido para o bom funcionamento diante de perigos enfrentados por personagens.

O oposto também existe, com pessoas fazendo personagens mecanicamente deficientes, de forma que ele será extremamente malsucedido em atividades que seriam o esperado, além de causar problemas para com seu papel dentro de um grupo.
 ● Um guerreiro que seja fraco ou possua defesas baixas não conseguirá proteger os aliados de inimigos e seu grupo não terá linha de frente;
 ● Um ladino que não é ágil o suficiente para desarmar armadilhas ou perceptivo o suficiente para detectá-las terá uma carreira muito curta como batedor.

Um personagem mecanicamente fraco não é “mais interpretativo” por ter carência numa área. Isso é o equivalente na vida real de um médico que tenha um ataque de pânico ao ver sangue, ou um bombeiro com fobia paralisante ao fogo. Eles não tornam-se mais interessantes por isso, tornam-se apenas incapazes de desempenhar a função a qual deveriam fazer para auxiliar outra pessoa.

Então, temos outro eixo, que parte do completamente inapto para fazer o que é o proposto, ao completamente combado e tomando os holofotes da mesa com seus combos. Um personagem remotamente normal ficaria no meio do eixo, talvez pendendo ligeiramente para um dos lados. Um dos extremos pode causar desavenças na mesa justamente por ser eficaz demais ou inútil demais.

Só lembrar!
Aí você que leu até aqui e conseguiu entender as diferenças das definições, e suas ramificações, não deve nem se surpreender com a resposta da pergunta inicial: “nenhuma”. Não há correlação entre uma ficha funcional (ou não) com ou interpretar bem (ou mal).

Ser fraco / forte mecanicamente está num eixo, que chamaremos de X; ser representativo está num eixo, que chamaremos de Y. Esses dois eixos não tem nenhuma intersecção, são duas linhas retas independentes que avaliam coisas diferentes.

Espero ter esclarecido algo. 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Sharingan: O atalho pra um quarto acolchoado

Vamos fazer algo diferente dessa vez e fazer uma análise literária parcial (apenas alguns personagens seletos) de Naruto, e ver que talvez, ou o Kishimoto tenha pesquisado mais que pareça, ou as coincidências são fantásticas. E a pergunta aqui é “Porque os Uchihas são loucos?” Talvez, tenhamos uma explicação pseudobiológica pra isso!

Aviso: entender esse artigo exige conhecimento básico de Naruto.

Zoídoido
É dito que todo usuário de Sharingan, além de seus poderes doidos todos (dentre alguns: visão através de ilusões, diferenciar clones de pessoas reais, criar ilusões apenas com contato visual, atear fogo no ponto focal, controlar bestas de destruição em massa, impelir objetos ou pessoas pra outra dimensão e criar uma armadura espectral para defender-se de seus oponentes) também concede ao usuário memória perfeita – que é a base do seu poder original, a cópia. Uma vez que veja algo com o Sharingan, nunca mais esquecerá. Tudo bem até aqui? Então, é aí que mora o perigo.

O Sharingan, traço icônico do clã Uchiha (além de cuspir fogo) concede todas essas vantagens. Mas elas são tão vantagens assim? Em combate, sim. Mas e fora dele? Lembremos que o Sharingan de um Uchiha desperta em momentos de trauma. Sasuke despertou o seu durante o massacre do clã, onde cada um de seus parentes vivos (exceto o irmão, o instigador de tal massacre) morreu. E com o Sharingan, ele vai manter essas memórias pra sempre, sem perder ou omitir algum detalhe [1]. Não vale apenas para traumas, porém; informações que mais tarde serão inúteis, como o momento do exame chuunin onde Rock Lee foi capaz de facilmente sobrepujá-lo, vão permanecer para sempre na memória de Sasuke, tendo como única defesa o bloqueio total dessas memórias – que uma vez vencido, faz com que retornem imediatamente com clareza total. Não é a toa que ele é traumatizado.

Olha o passarinho!
Não entendo muito de neurologia, mas fazendo uma analogia de computação, acredito que manter neurônios  em estado “somente leitura” não deve ser saudável para a saúde mental de um indivíduo. Esse tipo de memória perfeita, aliado a sentidos mais apurados é uma faca de dois gumes contra a saúde mental de um Uchiha: com seu Sharingan ativo, ele recebe uma leva de vantagens, e sem ele, não ganha traumas futuros – num mundo de conflito como o de Naruto, não adianta você pensar no depois se não sobreviver o agora. Estamos ainda falando de personagens que podem desativar seus poderes visuais, ao contrário daqueles com Mangekyou Eterno. Imagino que  tais personagens sejam obcecados por vingança (como Madara) não o fazem apenas porque são mentalmente instáveis – eles são mentalmente instáveis porque são incapazes de deixar para trás seus traumas e desavenças, junto com incontáveis outras informações de outrora, agora inúteis.

Suponhamos que Madara Uchiha, fundador do clã moderno dos Uchiha tenha passado por uma centena de batalhas com seu Sharingan ativo; para o resto de sua vida, ele vai ter memória total e absoluta de tudo que enxergou com seus olhos – táticas, conversas, planos, inimigos e tudo mais. Para sempre. Assim como um acumulador compulsivo cerca-se de objetos ou bens mesmo que inúteis, são incapazes de se livrar, um usuário de Sharingan, de forma automática faz o mesmo com memórias, independente de sua vontade, apesar por usar o Sharingan.

Bros before hoes.
Já sabemos que é fisicamente impossível que um Uchiha esqueça algo visto com seu Sharingan, mas o que isso insinua? Que eventualmente as memórias acumuladas começam a ter um custo cumulativo no psicológico do personagem. Cada batalha encarada não é apenas mais um combate vencido ou perdido – é uma série de situações, como um filme em HD perfeito que eternamente permanecerá dentro de suas memórias.
Mesmo que a capacidade de memorização do ser humano seja espantosa (estimada como algo entre 3 a 10 petabytes, 4 a 10 milhões  de gigas, aproximadamente 300 anos de filmes ininterruptos em HD [2]), ela ainda não é ilimitada. Como um paralelo, imagine que filmes em HD consumam muita da memória de seu computador; agora pense num HD superior, capaz de enxergar nuances de alçada microscópica (como Sasuke fez na luta contra Deidara), movimentos velozes em seus detalhes mais precisos (como o bater das asas de um beija-flor, frame por frame) simultaneamente? Pensou? Esse é o Sharingan.
  
Novamente “entrando” na mente de Madara Uchiha, lembre que ele passou anos entrando em conflitos constantes contra o bando de Hashirama Senju (o primeiro Hokage); desde o primeiro conflito e a primeira desavença, Madara nunca foi capaz de esquecer os combates e discussões, e isso é possível de ser visto em diversos capítulos do mangá: quando enfrenta outros personagens, Madara sempre toma como ponto de comparação Hashirama, seja de forma direta ou indireta: para ele, o combate contra tal oponente é tão recente como algo que aconteceu ontem, enquanto que na realidade, mais de 60 anos se passaram.

Com o grande poder, vem a grande insanidade.
Isso demonstra que um usuário de Sharingan com idade avançada é literalmente um fantasma de outra era, incapaz de se adaptar por sua memória perfeita oriunda de sua vantagem em relação aos outros. Perceba que a memória eidética proporcionada pelo Sharingan não se limita apenas a acontecimentos visuais; sensações físicas e auditivas são memorizadas de forma idêntica. Como prova, temos a técnica Izanami (usada por Itachi), que utiliza as sensações físicas do próprio usuário, assim como as do alvo para prendê-lo num loop de ilusões.

I can has sharingan
Agora, sabemos as vantagens e com elas, temos uma série de questionamentos, alguns óbvios, outros não. O Sharingan não apenas oferece formas diferentes de utilizar técnicas, mas literalmente, uma forma diferente de enxergar o mundo. Um usuário de Sharingan provavelmente torna-se "viciado" ou mesmo dependente dessa visão além do comum; como complicação extra, sabe-se que a utilização das técnicas mais avançadas, invariavelmente faz com que o portador desses olhos especiais fique cego, que é um evento bastante trágico para a carreira de um ninja cujas habilidades dependem de sua percepção acurada e poderes visuais. Isso talvez explique a necessidade de um usuário de Sharingan de recuperar essa visão plena, incluindo mesmo a remoção e subsequente reimplante do olho de um irmão: eles precisam recuperar essa visão, não importa como.

Finalizando, apesar de sua desvantagem em grande consumo de energia, os únicos personagens que tem uma chance de serem psicologicamente saudáveis usando os poderes dos Uchihas acabam sendo Danzo Shimura e Hatake Kakashi, que numa dose extra de ironia poética não são membros do clã Uchiha e sim pessoas normais com olhos implantados. Com o auxílio de uma venda ou um tapa-olho, podem usar seus olhos normais e com isso lidar com situações que não exijam tais habilidades. Pena que usuários do Sharingan eterno como não tenham essa sorte.

TL;DR: Sharingan faz você ficar louco por excesso de memórias perfeitas

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Desconstruindo RPG tradicional: Porque que níveis como único medidor de progressão?

    Quase todo RPG eletrônico e boa parte dos RPGs de mesa (sejam por tradição ou por escolha deliberada) dividem a progressão das habilidades personagens num único nível geral, que mede seu poder.

E os equips dela nem
são tão bons assim...
Ok, sabemos que contabilizar nível é uma forma fácil e simples de medir o progresso de poder dos personagens, nem que seja por alto. Dá pra se ter uma ideia geral quando você ouve “tenho um monge de nível 14” ou “meu personagem é um Shaman de 45º nível”. Você vê vários módulos de aventuras prontas com os dizeres “para personagens de 13-15 nível”, e dungeons próprias pra personagens do nível. Perceba que esse artigo não é contra a existência de níveis, mas sim níveis que regem toda progressão como única forma medir poder (com exclusão de equipamentos, por exemplo, quando aplicada).

   Agora, a pergunta torna-se: “Um nível geral pra toda progressão é necessariamente ruim?” E a resposta é “Normalmente sim!”. Agora, por quê isso?

      Primeiro, é uma progressão “menos realista” (note aspas) – um personagem que suba níveis ao invés de um crescimento orgânico tem “saltos” inexplicáveis de poder, por conveniência de design. Um guerreiro que sobe de nível subitamente passa a bater com mais precisão, se protege melhor de perigos, aguenta mais golpes e com sorte aprende uma manobra nova de combate, numa tacada só – numa epifânia mágica.

     É como se você estudasse sem nenhum progresso, e no final da ultima semana de aula do semestre, wham, conhecimento novo (incluindo coisas que não estudou) surge magicamente na sua mente – os novos conhecimentos não surgem com aprendizado gradual, mas sim do acúmulo de pontos de experiência.

Não esse tipo de progressão orgânica!
Segundo, mas não menos importante: a ilusão de progresso. Um nível alto não significa alto poder. Um personagem de nível 14 te dá uma ideia geral, mas assim como existem progressões diferentes, discrepâncias podem surgir. Um personagem de nível 14 pode ter muito mais recursos que o esperado, ou menos. Por exemplo, na 3e de D&D, um guerreiro progride de forma aritmética (+1 no ataque, 1 talento a cada 2 níveis), enquanto que um druida progride de forma exponencial (+X magias a cada certo nível, novas habilidades cumulativas com todas anteriores, além de melhorias pra habilidades já existentes).

       Terceiro; a existência de “níveis vazios” em conjunto com a ilusão do progresso. Isso é extremamente comum em jogos eletrônicos ou em aventuras prontas – como é esperado para uma progressão de desafios apropriados, o nível do personagem é que cria o nível do desafio, e que ao subir de nível, você estará pronto para novos desafios. Isso nem sempre é verdade.

       Mesmo que seu personagem tenha nível 12, não significa automaticamente que ele está apto a enfrentar desafios pra nível 12. Especialmente em jogos onde seu equipamento é parte de sua progressão (2/3 dos jRpgs como final fantasy, e basicamente todos edições que se inspiram ou são D&D), teu nível é apenas uma fração do que você pode fazer. Então porque apenas ele conta? Porque guias recomendam “coloque fulano no nível 60 para ter alguma chance de enfrentar o Ornitorrinco Flamejante de Jah” e em seguida “E equipe a espada suprema do queijo parmesão”.

Bem vindo ao nível 3 de Guerreiro!
Aproveite seu nada!
Claro que dentro do jogo pode não ser assim, mas aí é uma explicação dada por conveniência, e não pelo suporte do sistema escolhido – seja ele um RPG de mesa ou jogo eletrônico.

Existem também progressões paralelas representando diferentes níveis de proficiência em diferentes áreas.

Lembro que por exemplo, no jogo Disgaea cada categoria de arma diferente (Espadas, Machados, Lanças, etc) tem um nível de progressão, representando a competência do personagem com aquela – quanto maior o nível da arma, melhores skills de combate são liberadas, assim como o dano recebe um multiplicado exponencial. Assim, um personagem de nível 1 ou de nível 9999 com a a mesma proficiência de, por exemplo, espadas tem o mesmo número de skills que pode usar; esses dois personagens. Por exemplo, esses dois personagens aí pegam numa espada (ui) pela primeira vez; o dano não vai ser o mesmo por causa da diferença de atributos e equipamentos, mas a incapacidade do personagem usar golpes de “alto nível” é igual pra ambos.

Desses 150 pontos, 120 foram o chapéu!

Em jogos como GURPS ou mais recentes como M&M, uma progressão por alto em pontos de personagem contabiliza não o “poder real” de um personagem, mas sim vários aspectos de sua ficha – com 150 pontos você faz o Conan, o velho mago, o ágil ladrão ou o galã meloso que quebra os personagens do npc com sua prosopopeia flácida para acalentar bovinos.

M&M por exemplo, usa níveis (na verdade Níveis de Poder) como limitadores máximos do que o seu personagem pode fazer (ou hardcap, se você se sentir mais confortável com esse termo) e não como numero a esmo – um NP 10 significa que não pode ter nenhuma característica com bônus acima de 10; sua utilidade vem dos efeitos e não apenas do bônus numérico que ele fornece.

Se não são o método mais eficiente ou mesmo o mais fácil de lidar, porque então esse modelo de níveis é defendido de forma árdua?

Até mesmo Final Fantasy saiu dessa progressão de nível como, por exemplo, diferentes classes com caminhos diferentes (em FF13 e 13-2, você não tem “trinta níveis”, mas ganha xp desses trinta níveis pra distribuir em inúmeras habilidades que formam um pacote "parecido com classe”). Se até criadores de jogos eletrônicos percebem que esse método é defasado, porque ele ainda está em voga? Porque é defendido como um dos pilares do design?

                Essa pergunta eu deixo pra vocês responderem.

terça-feira, 13 de março de 2012

MMOs de Mesa: Como assim o "Next" é igual ao "Before"?

                Olha só que bonito, uma postagem de “revival“ do blog (e eu ainda preciso terminar aquele post de Mega Man Zero). Esse é um post sobre a quarta edição, predominantemente, mas não se preocupe, tem veneno pra todo lado e pra todos os gostos! Se parecer informal, é porque é. É uma postagem de fórum expandida e convertida, de forma que eu estou querendo expor meu peixe (ui).

As vezes, certas combinações funcionam
melhor que você esperava.
D&D quinta edição, chamado carinhosamente de D&D Next (ou algo do tipo, “a sua próxima experiência em D&D, a volta do D&D de verdade!”) está sendo feito*, e temos artigos feitos pela dupla dinâmica de escolas-véias assumidos, Mike Mearls e Monte Cook. Eu estou acompanhando esses artigos e sei lá, acho que falta algo neles: algum embasamento que não saia apenas do saudosismo e das regras caseiras (sem hífen) que esses carinhas criam em seus próprios jogos escola-véia, algo que não seja resumidamente “isso aí, cara, mostra pra esses jogadores de WOW como se joga RPG de verdade!”. E aí ignoram 5 anos da 4ª edição.
*assim supomos. Não tem nenhum dado mecânico sobre o jogo, exceto esses dois falando que tem coisas sendo feitas.

Acabou que não achei nada NOS posts desses caras porque 2/3 são glorificações de como as edições anteriores eram legais (mas não a 4ª!) e que o novo D&D vai fazer coisas fantásticas que a 3ª e a 2ª falhavam (mas a 4ª corrigiu, e ninguém quer lembrar dela). Alternativamente. vi coisas interessantíssimas nos comentários, e até comentei sobre isso nos fóruns da Spell (no tópico de expectativa sobre essa quinta edição). Uma das coisas é a desvalorização dos ataques básicos em detrimento de poderes e manobras especiais, e como isso “automatiza” o jogo. Ou melhor, a desvalorização de tudo que não seja poderes e manobras especiais. E aí não tenho como não concordar. Calma. Eu chego lá.

         O cerne do combate em D&D (eu ia dizer só na 4ª, mas é universal) é calcado no seguinte pensamento: "os jogadores estarão fazendo as melhores opções de combate a cada rodada, de forma que isso faça com que eles sejam recompensados com isso". Qualquer jogador de D&D que jogue mais de uma sessão eventualmente percebe que a batalha real sempre é a manutenção dos recursos dos personagens contra os desafios criados pelo mestre, sejam combates ou exploração.

 Se você tem um poder de combate que é melhor que um golpe comum, porque não usá-lo? Quer dizer, pra que eu vou bater com um golpe comum com uma arma, causando [Arma]+Modificador Força ou (2x [Arma])+Modificador de Força (no 21º nível), se no primeiro nível de guerreiro, eu posso dar exatamente esse mesmo dano com um efeito adicional de empurrar o oponente?

                A pergunta não é “Pra que eu vou me limitar em usar uma ação universal sem nenhum bônus” e sim “porque eu DEVERIA me limitar a usar coisas que são menos eficientes do que eu tenho a disposição?”. Um golpe comum é facilmente ignorável se comparada com várias ações com inúmeros bônus ou diferentes sinergias. Defasado, até. Acho que é daí que veio o mimimi de “D&D virou videogame” e “todo mundo usa poder todo tempo”.

                Até parece que isso é algo único da 4e. Exceto que as edições anteriores também sempre tiveram um pé nesse aspecto, onde você recompensará os jogadores com menor perda de recursos (e como eu disse acima, os recursos de um personagem são sua real medida de aguentar ou não – contabilizando cargas de itens, pontos de vida, poções, magias, etc). Então, esse aspecto sempre esteve aí. Confere?

                É muito fácil para certos grupos simplesmente ligar o modo automático e sair porrandolocando tudo na frente com esses mesmos aspectos em sinergia (fulano segura a linha de frente, enquanto beltrano impõe condições, o cicrano bate e joãozinho cura e mantém o grupo de pé, gogogogo 300 dps huehuehueBRBR).

É claro que na prática, não é sempre assim (e nem tem que ser), mas existe uma margem enorme de segurança pra quando você simplesmente está de saco cheio de ficar de firula e simplesmente quer chutar o balde (tipo quando aquele cara chatíssimo que parece utilizar toda e qualquer oportunidade pra fazer um monólogo improvisado usando todas suas aulas de teatro o faz no final de um one shot sem pretensão, só pra falar que eu personagem é profundo, mesmo isso tendo ido completamente contra a caracterização anterior*). O que ponto que quero chegar é esse: A 4e “deu essa margem” porque deixou isso explícito (finalmente!) e isso irritou MUITA gente.
*inspirado em fatos reais, nomes não citados para proteger identidades inocentes teatrais alheias.

                E é isso que a velhanova (olha o duplipensar!) equipe do Mearls e Cook quer “corrigir” que a 4ª fez (direito); o objetivo do design não quer jogadores confiantes de que o mestre precisa se esforçar pra morrer - porque tudo que eles podem fazer está na ficha deles, e o que não está na ficha está no livro do jogador, disponível pra eles. Quando na capa tá escrito que o livro É para o jogador, não tem necessidade de tabelas de itens em livros do / pro mestre; não querem que os jogadores percebam que sim, eles podem ditar o ritmo da aventura ao ligar o automático e trucidar tudo que vem pela frente, porque o sistema te fornece maravilhosas ferramentas pra suportar esse tipo de jogo.

                E convenhamos, é convenientemente usar seus poderes que são mais eficazes que apenas atacar de forma básica. Não é um conceito difícil. Isso nunca mudou. O que mudou foi a forma de como os jogadores encaram isso. Se há um equilíbrio maior entre o grupo, – e alguns dizem em detrimento da diversidade, mas é uma diversidade onde 2/3 de um livro só serve pra 1/4 das classes disponíveis, então pra mim tem algo de errado nessa afirmação – nada mais fácil do que qualquer membro do grupo tomar a dianteira (ao invés de depender de encantamentos favoráveis dos conjuradores que ditavam o ritmo) .

                 Criar aventuras pra esse tipo de jogador – o grupo equilibrado que pode impor um certo ritmo) é um saco e dá trabalho. É muito mais fácil fazer masmorra com armadilha de fosso com espinhos, do que pensar que os jogadores podem FURAR a parede da dungeon pelo lado de fora e contorná-la. Por isso que aventuras prontas pra personagens mais que heroicos (exemplares e especialmente os épicos) são tão raras. É fácil pensar no que para um bundão que só sabe andar e bater e foi condicionado pra pensar que é só isso que ele pode fazer (se parte do material tá longe das mãos do jogador). Por outro lado, é muito mais difícil tentar prever as ações de um grupo que tem consciência do que não pode fazer (porque todo resto subitamente torna-se uma opção válida).

                Eu vou ser ovacionado ou apedrejado por esse comentário, mas vamos lá.

               Pelo outro lado, o jogador que SÓ se atém a ficha vai travar em algum desafio onde os poderes não resolvam. Poderes? Não é só o que seu personagem pode fazer. Aquilo dali é o que você faz em combate. Teu personagem ainda pode e deve interagir com cenário, ter ideias idiotas, fazer besteiras. Ter poderes na sua ficha não evitaria isso, nunca. Desestimulam, porque "não tá mastigado". Mas não evitam. D&D nunca teve um estimulo a interpretação em suas regras, e até o desafio de perícia que tentou esse tipo de interação com a interpretação teve que passar por uma sintonia fina extensa até chegar num modo que funcionasse. Não foi a 4ª edição que tornou tudo um “MMO de mesa” (sério, gente, 5 anos depois e ainda eu leio isso volta e meia, ô implicância). Foram os jogadores usando a ficha como bíblia, e não como guias.

                Onde eu quero chegar com isso tudo? Ao invés de se focar no aspecto saudosista que os dois designers chefes erroneamente insinuam que vai corrigir tudo magicamente, poderiam trabalhar em coisas mais relevantes, como números absurdos que escalam loucamente; citando outro jogo do – ou que pelo menos começou no – sistema d20, M&M. Se você pergunta pra um jogador acostumado a níveis altos em 3e e 4e de D&D, quanto que +5 de bônus significa, a resposta vai ser algo do tipo "não muito, só mais uma gota no balde de bônus". Agora, pergunte o mesmo pra jogadores de M&M e a resposta vai ser algo do tipo "Uau, cara, +5 é muita coisa!", independente do NP.

A 4e quase deu um passo nessa direção com o +½ nível em todos os testes; é o prenuncio de uma matemática se o resto do sistema não esperasse que seu personagem, já tendo +15 de nível também precise de +5 de arma, +10 de atributo, +3 de talentos, sinergia e pra socar um inimigo apropriado.

                Se o jogo que lida com poderes de quadrinhos lida com situações cósmicas com números baixos, porque não aquele que lida com chutar portas e socar orcs não consegue manter uma matemática que siga um padrão?

tl;dr: não cuspam no prato que comeram, designers.


Bônus track! Manifesto anticonjuradores dominando o jogo: versão matemática absurda

                O pior exemplo dessa matemática falha e péssima inflação de números são as perícias épicas da 3e. Elas foram criadas pra dar a ideia de que tem número alto é um floco de especial e único entre os aventureiros e com isso poderoso com habilidades especiais e ‘únicas’; na verdade, serve pra mostrar quanto que um não-conjurador tem que ser idiotamente "poderoso" em números pra emular coisas que conjuradores faziam brincando.

                Como exemplo, Equilibrar-se CD 120 (cento e vinte, você não leu errado) pra ficar de pé numa nuvem, coisa que Clérigos ou Druidas de 8º nível fazem sem testes e MELHOR com Caminhar no Ar (já que podiam, sabe, andar no ar, literalmente)

                Ou o pior exemplo pra mim, que é o de Decifrar Escrita (que por si só já uma perícia situacional e ridícula) com CD 50+5 por nível da magia pra decifrar pergaminhos mágicos (decifrar no sentido de ver o que é, não ativar)... coisa que QUALQUER conjurador faz com Ler magia, aquela de 0º nível, que até mesmo mago que precisa preparar magia, pode fazer SEM ter grimório porque é uma “habilidade natural da classe”. Pra que subir 30 niveis de ladino, mesmo?

terça-feira, 24 de maio de 2011

Pontos de Vida e Pulsos de Cura vs Resenhas Falaciosas (mais bônus)

Vamos por partes: um sábado aí, eu “converti” um amigo pessoal a dar uma chance para 4ª edição de D&D com uma aproximação diferente. Ao invés de citar o famoso argumento de que a "mecânica é melhor", "as contas fazem mais sentido" e que o "jogo é mais tático" e tudo mais, quem tem uma opinião calcificada por opiniões de "especialistas de RPG" que pregam que D&D 4e é um retrocesso, dificilmente vai ser convencido por isso.

Ele reclamou que leu numa resenha (depois descobri que foi a antiga da Dragon Slayer que falava mal da 4e) que “os personagens são imortais desde o primeiro nível”. A resenha afirma que:

Continuando no exemplo, os clérigos nem mesmo são curandeiros – já que todos os personagem são capazes de curar a seus próprios ferimentos, através de uma mecânica que não tem muito sentido ou explicação.

Uma quantidade monstruosa de pontos de vida, poderes de cura onipresentes e incontáveis chances de escapar da morte significam que você mais vai temer por seu personagem. Não á muito sentido em traçar estratégias ou fazer planos mirabolantes para vencer os vilões: tudo foi deixado muito simples e fácil para sua conveniência, bastando escolher qual poder usar a cada rodada.”


Gente, que mentira! Por causa desse texto, também conversamos sobre os Pontos de Vida e Pulsos de Cura. Vou elaborar mais sobre esse ponto e tentar desmentir esse “mito” (ou melhor, essa afirmação falsa), e terminar o texto com a tal anedota que fez esse amigo meu pensar em dar uma segunda chance.

Pontos de Vida e Pulsos de Cura

Pontos de vida acabam não representando ferimentos mas sim qualquer tipo de coisa que atrapalhe o personagem, desde um golpe desviado que pegou de raspão, um poderoso golpe de maça que mesmo defendido com seu escudo deixou seu braço doendo ou uma esquiva acrobática que drena suas reservas de energia. O ponto é, receber dano não é sinônimo de receber ferimentos. Essa distinção existe na 4ª edição de D&D, deal with it.

A condição Sangrando (Bloodied), significa que algum ataque REALMENTE atingiu o oponente. Ao contrário de GURPS, por exemplo, onde cada ataque que acerta, fere o alvo (apesar de que com a vantagem pontos de vida extras, você pode ter um personagem com 8 flechas cravadas e ainda lutando), D&D possui uma abstração de que PVs são mais que sua capacidade de agir como "esponja de feridas".

Pulsos de Cura, tão rechaçados, como todos que criticam esse sistema como "mais videogame" com certeza apenas leram 'por alto' e dizem que sabem do seu funcionamento.

Essa mecânica adiciona um elemento de fadiga bem diferente do modo videogame onde pontos de vida não acarretam nenhuma penalidade; fazem o velho "provérbio" de Magic: The Gathering parecer verdade, que diz que "Apenas um ponto de vida importa: o último".

Vamos ao que importa: Pulso de Cura é nome dado ao número de vezes que o personagem pode recuperar seus pontos de vida após receber um efeito restaurador, (valor de restauração normalmente é 1/4 dos seus pontos de vida totais). A opção conhecida como "Retomar o fôlego" (ou Second Wind) permite ao personagem recuperar sozinho um ÚNICO pulso de cura, uma vez por encontro. Em descansos curtos, o personagem pode gastar quantos quiser para recuperar pontos de vida.

"Não se preocupa, ainda tenho 350 pontos de vida!"

Você pode reparar que um personagem com 18 pulsos de cura pode ser curado 18 vezes com esse valor: parece muito? Não é tanto assim: a palavra chave é "pode ser".


Se o personagem possui 18 pulsos, por exemplo, fica subentendido (pelo design do sistema) que ele tenha 3 pulsos / encontro (um "dia padrão" previsto pelo livro do mestre possui uma média de 6 encontros); porém, a pergunta é: como o personagem vai fazer, se o único poder de recuperação universal é apenas 1x por encontro?

Sozinho ele não vai, a menos que seja ou tenha ajuda de... um líder.

Exemplo de grupo completo: (em ordem) Controlador, Líder, Agressor, Defensor e ...Mikuru.

Sem um líder (que é capaz de permitir que seus aliados utilizem seus Pulsos de Cura), ele estará limitado a gastar 1 pulso de cura por combate com o Retomar o Fôlego, mais qualquer outro oriundo de poderes diários ou de encontro, que como o nome deixa claro, são uma vez por dia. E o resto? Só pode gastar entre combates, em descansos curtos. Tomou mais dano que poderia recuperar nessas lutas, sem poder descansar entre elas? Vai pra lona, sem choro.

Sabe a afirmação de "Personagens Imortais" que você leu ali na revista? Balela, papo de quem não leu o sistema ou distorceu até fazer com que pareça ruim.

Se você ultrapassar teu limite de pulsos de cura (ou seja, o personagem acima gastar seus 18 pulsos de cura e ainda assim receber um efeito de recuperação), todos eles irão restaurar apenas... 1 ponto de vida.

Isso representa que seu corpo não aguenta mais o tranco, ele tá pedindo por um descanso estendido, uma chance de verdade de pendurar as chuteiras e relaxar. Mesmo um grupo de 4 clérigos, sem pulsos de cura, só vai curar 1 pv por poder de recuperação. Cadê a tal imortalidade, agora?

"Maldito frango atroz. Na próxima vez a gente pede uma pizza, tá?"

Pior ainda: Digamos que o guerreiro (vamos chamá-lo de Joseph, o Foguete) tenha 60 pontos de vida. Em um combate, ele recebe diversos ataques e fica apenas com 10 Pontos de vida. Sem um líder em campo, Joseph possui apenas duas alternativas para recuperá-los em combate: atingir o oponente com algum poder que permita que gaste um Pulso de Cura, ou utilizar-se do Retomar o Fôlego.

Como defensor, o papel esperado de Joseph é que ele fique na linha de frente impedindo e controlando avanços de inimigos, recebendo assim boa parte do dano dos combatentes inimigos. Com um líder para reforçar essa capacidade, Joseph permanece de pé enquanto segura os oponentes realizando seu papel como defensor de um grupo; sem um líder, sua capacidade de aguentar golpes torna-se limitada e seu papel vai falhar, provavelmente deixando brechas para que os oponentes atinjam todos envolvidos, deixando o grupo na mão.

Querem uma prova ainda maior de que os personagens estão longe de serem os "imortais" como dito em certas 'mídias especializadas'? Faça um grupo sem defensores ou pior, um grupo sem líderes e veja a carnificina acontecer. Se uma reclamação pode ser feita, é que a 4ª edição exige que o trabalho de equipe exista para que os personagens-jogadores sejam bem sucedidos em suas empreitadas.

Acima de tudo, D&D é um jogo de fantasia HERÓICA. Conan não ficava de cama depois de uma luta; a Sociedade do Anel não ficava uma semana descansando depois de lutar com trocentos orcs. Porque Joseph, o foguete precisa ficar duas semanas de cama (ou talvez mais) se ele é tão herói quanto os já consagrados, e os famosos não precisam. É o cachê que cobre um plano de saúde clerical?

O ponto é simples: os heróis são "larger than life", e num filme, revistinha ou desenho, um herói caí e levanta N vezes até derrotar os inimigos ou luta contra hordas de vilões até salvar o dia. Aí ele vai pro hospital / acampamento por duas semana após todos seus ossos do corpo quebrados; quando outra ameaça surge, ele está pronto pra outra. Esse é o espírito proposto, isso é heroísmo. Não ficar 60 dias de molho para recuperar-se do combate contra o rival; isso a gente faz na vida real.


Adendo pós-post inicial: Nibelung (sexy como ele só) frisou dois pontos importantes: Um grupo sem nenhum líder é funcional na 4e... Mas um líder ajuda com bem mais coisas que cura; buffs, ações extras e outros bônus ajudam mais que as curas.

Bonus track! (a tal anedota)

Usei o exemplo do guerreiro épico parando o Atropelar de um tarrasque com uma arma de haste. Sim, é uma das situações mais inusitadas, ainda mais pra quem começou em AD&D ou antes. Isso não faz o mínimo sentido, certo? Errado!

Foi mais ou menos assim:

Lumine: "Então, consegue imaginar o Tarrasque vindo em carga, fúrias nos olhos, rosnando enquanto suas presas brilham pela velocidade. O guerreiro prepara sua alabarda e se reforça, atingido a cabeça da criatura e levantando poeira enquanto sua corrida é interrompida. E aí, o que acha?"

Amigo: "Isso é ridículo, o cara é só uma pessoa!"

Lumine: "Você aceitaria se fosse uma muralha de energia sendo erguida por um mago?"

Amigo: "Fácil, porque a muralha é algo que o cara criou com treinamento, com poderes arcanos. Um cara sozinho não tem como parar o Tarrasque!"

Lumine: "E o mago sozinho consegue?"

Amigo: "Bem, sim, mas tem que ser de nível alto."

Lumine: "E um guerreiro de nível alto, não pode? Tu tá pensando por baixo; um guerreiro de nível 30 não é um Conan. Conan é nível 10."

Amigo: "Como assim, então o que seria um guerreiro de nível 30?"

Lumine: "Um guerreiro de nível 10 é uma pessoa muito acima do normal, Conan por exemplo; um cara de nível 30 é um Bewoulf, é um Hercules. Mitos, lendas! Consegue imaginar o Hércules parando o Tarrasque com uma alabarda?"

Amigo: "Até desarmado!"

Lumine: "Isso, meu amigo, é o espírito da 4e; chances pra todos."

Amigo: "Ok, tu me convenceu de dar uma chance agora. Só marcar!"

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Não seja mala, mestre!

Alerta: Muralha de texto. Hooooooo!

É uma generalização grosseira até, mas boa parte dos jogadores de rpg já passaram - ou pior ainda, já fizeram - uma situação em que a decisão e o controle do personagem é feita pelo mestre.

Perceba que não falei em situações como acreditar em blefes ou se sentir intimidado, e sim cenas onde a decisão deveria partir do jogador.

Talvez, em busca de uma cena mais dramática, uma decisão que parece "óbvia" e "condiz com a personalidade de seu personagem", faz com que o jogador perca o controle temporariamente de seu personagem justamente porque o roteiro e desígnios do mestre assim o pedem.

Dessa forma, um jogador de um brujah (faz tempo...) não tem decisão sobre sair ou não de um combate. Ele é um brujah, oras, e brujahs lutam!

Pára tudo, aperta o freio. Como assim? A proposta do jogo não é que o personagem seja meu? Não é sou eu quem controla as ações dele?

Por exemplo, ao invés de perguntar o que o jogador faz quando está na porta da grande mansão do governador, o mestre começa a descrição da porta e corredores, terminando com um "você quer ir pra esquerda ou pra direita?". Todo processo de decisão foi eliminado para uma introdução "cinemática".

Outra coisa desagradável é enviar os personagens correndo e gritando com as espadas desembainhadas na direção do vilão, e aí, é óbvio, eles ficam parados encarando ele enquanto o maldito faz um discurso e termina-se com "rolem a iniciativa" e "fulano, você está mais perto porque... Hum... Eu quis".

Muito comum em aventuras prontas, onde há pequenas (se você for sortudo, serão pequenas) caixas de texto com os dizeres "Leia isso para seus jogadores", enquanto os personagens (e jogadores) ficam olhando enquanto o mestre lê em voz alta todo plano mestre e motivações do inimigo para transformar todos humanos em guaxinins-ornitorrincos e com isso criar uma nova ordem mundial.

Algumas aventuras prontas utilizam unicamente esse recurso como forma de passar a história; seguem uma estrutura rígida de forma que as ações dos jogadores não podem invalidar o roteiro e história previamente preparada, os jogadores tornam-se quase espectadores. Pior ainda quando o clímax é resolvido num duelo(épico) entre NPCs, o que faz com que a participação dos jogadores resuma-se a "seguir o npc chave até o final e assistir a luta".

E pro escritor, o que seria o clímax da aventura, com o parágono do bem enfrentando o poderoso vilão, na verdade não passa de um modo de transformar os jogadores em aprendizes de Falcão Bueno, cujo papel é comentar a luta.

Como quase tudo nesse jogo, se isso for feito de forma bem trabalhada, é -possível- que os jogadores venham a se lembrar como a luta entre dois campeões do bem e do mal (ou seja lá qual for a ideologia defendida por cada). Se for feito de forma ruim, vai ficar ainda mais evidente que as ações dos jogadores não valeram de nada no roteiro. Pra que se esforçar e se engajar no jogo, se no final, tudo que você faz é irrelevante? Bem, não deveria ser!

A famosa aventura "A Mais Longa das Noites", aventura introdutória de Reinos de Ferro (um ótimo cenário, alias) é ao mesmo tempo um exemplo clássico de "siga o npc até o final", com o diferencial de que apesar do livro ser uma história fechada, tem mais opções de "o que pode acontecer caso isso mude" que grande parte das outras aventuras prontas que já li. Claro que temos uma forte... sugestão de seguir a aventura nos trilhos (por exemplo, o livro admite que Alexia precisa escapar no final da primeira parte, senão não tem aventura). Então, se o mestre quiser usar os três livros que comprou, independente dos esforços dos PJs, vai deixar a Alexia fugir. Mesmo que amarrada e amordaçada por jogadores paranóicos.

(Obviamente, existem outras, mas esse exemplo foi mais relevante que eu lembrei, e que os livros eu tinha a mão.)

Ou seja, o verdadeiro problema não está em, ocasionalmente, tomar as rédeas da coisa toda de forma inteligente e levar o jogo adiante, mas sim em abusar do controle e fazer o máximo possível para evitar que os jogadores escapem do roteiro pré-definido que você se matou pra criar e decorar. A questão é: se o enredo é tão bom assim que deve permanecer intocado pelas decisões dos jogadores, o melhor é você aproveitar e escrever um romance com ele.

RPG: Serious Business

Aliás, vamos fazer um experimento interessante. Pare de ler isso e imagine que você está explicando "o que é RPG" pra uma pessoa que nunca viu isso e não sabe o que é esse jogo, nem nunca ouviu falar (talvez por alto).

Imaginou? Okay, deve ter sido algo como "Ah...É um jogo parecido com teatro, só que não tem um roteiro fixo, onde todos os participantes tem vez".

Ênfase nessa frase: Não tem um roteiro fixo.

Afinal, o mais importante do RPG (depois da diversão e das overdoses de coca, lanches e café) é montar uma história em grupo. Aliás, os jogadores não querem seguir uma história que só você inventou, porque provavelmente a sua história é baseada em FF7 ou Ocarina of Time e eles já tem isso em casa no playstation deles, com trilha sonora, button mashing, grind, gráficos bonitinhos, ninguém pra gritar com eles dizendo que estão tomando as decisões erradas no jogo e nenhum compromisso em ficar marcando sessão. (Exceto aquela maldita árvore Deku. Como eu odiava aquela maldita árvores.)

Mestres e jogadores deveriam trabalhar juntos na criação de uma história (nem sempre coesa, mas coletiva), mas por sem nenhuma chance de dúvida, divertida para todos ao redor da mesa (ou todos na sala de bate papo, ou fórum, ou o que seja). A visão do Mestre não é a mais importante e nem deveria ser a única, da mesma forma que um jogador "estrela" deve ser o mais importante da mesa, independente se é uma menina bonita que o mestre quer xavecar (me senti com 40 anos nessa expressão), melhor amigo, irmão, ou o oposto, um jogador que sempre pega os piores inimigos e situações, porque é alguém que o mestre tem algum conflito (fora do jogo).

Vamos ser honestos: Ninguém se diverte com isso. Por mais 'sutil' que seja o roubo, jogadores não são burros e percebem quando alguém tem poder e/ou importância a mais. Ainda mais quando não são eles!

Fazer com que a história gire ao redor de um personagem é possível, mas com a concessão e concordância de todos envolvidos. Já ouvi (e presenciei em mesa, o que é pior) causos horríveis de grupos que se fragmentaram por isso (alias, um dos meus grupos acabou por isso!). Se num determinado momento as decisões de todos jogadores menos um ou dois forem consideradas dentro da história, sem nenhum aviso prévio nem motivo real além da implicância alheia, tem realmente algo de errado aí.

Como dito antes, a interação com os jogadores pode, se encarada como algo relevante pelo mestre, levar a história original programada a diferentes rumos. Rumos que o mestre sequer cogitou. E isso é algo ruim? Depende de que lado do escudo do mestre você está. Se é um jogador, é maravilhoso: suas ações estão surtindo um efeito visível e o mundo de campanha é algo que você pode interagir. Para o mestre não-flexível, pode ser um pesadelo: são dias, e as vezes semanas (dependendo da organização do cara, meses) de preparação jogados fora, com a história tendo um desfecho diferente daquilo que foi planejado com antecedência, impedindo você de fechar as pontas soltas num final digno de obra de arte.

Sei que é uma afirmação bem exagerada pra em ambos lados, mas é uma verdade em escala menor. Ninguém planejaria uma campanha com duração de um ano e gostaria que seus planos fosse por água a baixo na primeira sessão, quando um jogador desconfiado / paranóico ataca e vence o vilão antes que ele traísse o rei, ou o espião que deveria ser um adversário recorrente e se redimir perto do final campanha.

RPG na Internet: Ainda MAIS Serious Business.

Acaba caindo no velho caso da flexibilidade e capacidade de improviso do mestre, e um bom "jogo de cintura". Um mestre rígido demais acabaria a campanha ali, e um mestre extremista, acabaria na hora; um mestre mais flexível utilizaria esse fato para que de alguma forma os resultados das ações do PJs, mesmo que atrapalhassem seus planos do grande vilão, pudessem ter um desfecho lógico.

Diga-se de passagem, um mestre flexível se permite o privilégio de ser surpreendido pelos jogadores, de ser desafiado a criar uma história coerente com acontecimentos fora de seu controle, possivelmente de até se emocionar com sua própria história, ou de ver ela se tornar algo ainda melhor diante de seus olhos.

Utilizando o mesmo exemplo, após os jogadores eliminarem o espião, essa atitude deles serviu para que se tornem alvo prioritário do vilão, já que foram capazes de interromper um plano dele. Além disso, os vilões raramente trabalham sozinhos. E seus aliados, seu clã, sua família? E se o rei não entender que as ações dos PJs foram na intenção de salvá-lo, e resolver punir os personagens com uma boa estadia na masmorra mais próxima por matar um de seus conselheiros sem provocação? São tantos "e se?" que um mestre esperto pode simplesmente remodelar o início da aventura pra algo condizente com a situação atual, e não perder seus "meses de preparação".

Enfim, são inumeras as possibilidades de conduzir um grupo até uma certa aventura sem puxar os personagens pelo cabelo até a fuça do vilão e dizer "rolem a iniciativa", não existe argumento que justifique o controle exagerado que certos narradores exercem em suas campanhas, já foi dito e aqui será novamente repetido: o importante do jogo é diversão, e poucos jogadores vão se divertir num jogo desses, especialmente depois de terem participado de jogos mais livres. Ou "menos sérios, pff" dirá o mestre mala.

Olha só outro termo nebuloso: "Jogar sério"

O que nos leva a outro péssimo hábito que alguns mestres tem, escolher qual vai ser o clima do jogo sem consultar seus jogadores, alguns dos exemplos mais comuns são ralhar com alguém ("você tá avacalhando com o jogo, velho! Tá achando que é brincadeira?") por causa de piadas que fizeram os demais rirem ("Quebrou o clima de tensão, menos 10% de XP"), fazer qualquer estratégia que não seja sacar uma espada e gritar "chaaaarge!" falhar - ou o oposto, colocar combates absurdamente dificeis, "vocês precisam resolver na estratégia, mey! É pra pensar!", mesmo que a estratégia seja obvia pra o mestre... porque como criador da única forma de vencer a criatura / inimigo (algo "intuitivo" como atingir o golem de 3 metros de ferro com um frasco de água benta para anular sua imunidade a tudo), é óbvio para ele (mas não para os outros).

Entre outras formas de "ditadura". Hmm... Isso pode ser expandido para outro artigo. Algum outro dia, eu acho.

Ps Importantíssimo: Esse artigo só pode ser feito com a imensa colaboração da DarkLady com seus eternos 13 anos, Wilken / Kear, capaz de fullparrear enquanto faz corner pressure e da Myako, minha namorada jailbait, sua linda!

tl;dr: Não seja mala, mestre!

segunda-feira, 28 de março de 2011

Ganchos, Backgrounds Interligados e... Tidus.

O uso do termo "colocar ganchos" na criação de um background de personagem parece ser completamente alienígena pra mim. Eu acho que npcs e localidades, assim como eventos podem ter ganchos, mas personagens jogadores? Nunca deveriam!

Antes que você fale “ué, o Lumine endoidou de vez, de novo?”, analise comigo.

Os personagens são os principais da história; eles não precisam ser "fisgados" pelo mestre pra histórias, porque (em teoria, pelo menos), uma boa partida / campanha tem toda a história sobre eles.

Fez sentido? Ok, podemos elaborar mais um pouco.

Mesmo com toda tecnologia moderna jogo de videogame, até agora a experiência criada num jogo eletrônico terá que evoluir ao ponto de oferecer uma experiência verdadeiramente individual para cada jogador distinto, quem dirá um grupo de 3-6 jogadores de forma simultânea.

O elemento humano também, onipresente numa mesa mas supérfluo em jogos eletrônico online e tudo mais me faz imaginar: é assim mesmo?

Então, um jogo eletrônico pode misturar a história de todos personagens do grupo em algo interligado e semi coeso:

O leão antropomorfico caladão é guardião da invocadora talentosa,
que também é protegida pela maga gostosa. Essa maga era noiva do irmão do esportista retardado funcional, que odeia uma etnia de humanos, mas não sabe que sua companheira, a ladra hiperativa que é prima da invocadora talentosa com síndrome de diálogo de Shatner é dessa etnia! Essa mesma invocadora é apaixonada pelo jogador chorão de asfixia-autoerótica-ball que é apadrinhado pelo maior badass do mundo, coincidentemente, o tio adotivo da invocadora shatneresca, cujo outro tio adotivo é o centro do monstro grandão que é a ameaça ao mundo... que é pai do jogador chorão, melhor amigo do pai da invocadora talentosa, cujo ultimo ato antes de falecer foi deixar ... o leão antropomórfico caladão responsável como guardião da invocadora tímida!

9 personagens e diversas relações entre eles.


Se você não reconheceu, isso foi uma descrição de FFX e não uma novela mexicana,
Qualquer motivo pra postar o Tidus com uma cara feia, eu o farei!

E no RPG de mesa? Bem, quantas vezes você já viu numa mesa onde todos personagens possam ter um background com pontos em comum interligados (seja ele um tio, um conhecido, um parente, ou mesmo uma ligação com o vilão) servir como motivo para esses caras andarem juntos? Poucas vezes? Nenhuma? Comum?

Depende de cada mesa, mas normalmente, isso é esquecido em viés do individualismo da criação. Ao invés de ter o guerreiro humano que veio das clichês montanhas gélidas do norte e o mago meio-elfo que veio do deserto do oeste, poderemos ter esse mesmo guerreiro que conheceu o mago na infância e se mudou com os pais teria um motivo desses dois caras andarem juntos.

E se o vilão matou o outro colega de infância deles, um halfling? De repente, dois caras que não tem mais nada a ver, podem se juntar novamente depois de anos, cada um com novos companheiros e zás, temos um motivo para um guerreiro humano, um mago meio-elfo, um clérigo dragonborn (amigo do humano) e uma deva ladina (consorte do meio-elfo) andarem juntos.

Se os personagens tem ganchos, eles não estarão sendo fisgados: eles estão fisgando história pra si.

Tudo muito bonito e bem ordenado até aí.

...e se um novo jogador entrar na mesa, como faremos para que esse grupo coeso ganhe um novo integrante? Essa é um dos maiores problemas de se interligar backgrounds no começo de uma campanha.

Tem sempre a alternativa de enfiar o novo jogador sem motivo, mas... e se?

Pense no seu grupo de amigos (o fora do jogo, no caso), como novas pessoas são adicionadas a ele? Você conhece alguém e passa a levar ao seu círculo social? Um amigo em comum entre dois ou mais amigos passa a frequentar suas rodas e programas? Ou simplesmente é uma pessoa nova que você conheceu e que divide os mesmos interesses que você? Ou mesmo um desconhecido total que foi com a sua cara e quer conhecer você (segunda intenções não obrigatoriamente inclusas!)?

Se você não for Forever Alone, todas respostas podem ter um “ei, poderia ser assim”. E seria diferente na mesa? Claro que poderia, mas pra que forçar se podemos explicar?

Podemos pensar que o novo jogador, que jogará com um monge eladrin, é um conhecido da deva de outras viagens e seu conhecimento do local pode ser benéfico ao grupo; acaba adquirindo uma amizade / companheirismo / baitolagem absoluta e vai com esses caras.

Ou então, ele é contratado como guia, e decide ir com o grupo. Ou mesmo um monge que como parte do treinamento decide se unir ao grupo, já que as dificuldades trarão o caminho para sua iluminação.

O que importa é, com um pouco de criatividade, você pode encaixar qualquer situação. Até mesmo um demônio que trabalha com burocracia nos nove infernos poderia entrar nesse grupo, com a desculpa certa. Vai ver o vilão deve a contabilidade infernal, e a forma mais fácil dele derrubar esse cara do poder é se aliando a um grupo de heróis, desde que ele consiga segurar seus impulsos burocráticos e partir para ação.

Na dúvida, pense da mesma forma que eu comecei o exemplo ali em cima: “Mesmo sendo inútil, como o Kihmari faz parte desse grupo?” e construa a relações ao redor dele. No caso, algo como mais "Ok, mas porque eu andaria com esse monte de gente esquisita?".